a imagem apresenta uma planta de buva com sintomas de resistência ao herbicida glifosato

Entenda a resistência ao glifosato e esteja um passo à frente

Você sabia que a resistência ao glifosato já foi considerada improvável? Mais de 20 anos haviam se passado desde o seu lançamento, em 1974, e nenhum relato de planta daninha resistente.

Em 1996, a soja geneticamente modificada para resistir ao glifosato foi disponibilizada no mercado. E o herbicida, anteriormente posicionado apenas em operações de dessecação, passou a ser usado durante o ciclo da cultura. Pulverizado uma, duas, três ou mais vezes!

Então, ironicamente, no mesmo ano, o improvável aconteceu. Biótipos de azevém perene (Lolium rigidum), em pomares australianos, inauguraram a lista da resistência ao glifosato. E desde então, ela só cresce.

Assim, entender como ocorre e o impacto da resistência ao glifosato vai te ajudar a adotar as melhores práticas de manejo e reduzir as perdas.

A lista

Até o momento, são documentados 309 casos de resistência ao glifosato junto ao International Survey of Herbicide Resistat Weeds. Quinze deles, no Brasil. Convém destacar que 30% dos 50 casos de resistência relatados no país, envolvem o herbicida.

Entre as plantas daninhas estão espécies de azevém, buva, capim-amargoso, capim-branco, caruru e capim pé-de-galinha.

imagem de uma lavoura de soja com muitas plantas de buva - Entenda a resistência ao glifosato e esteja um passo à frente
No Brasil, a buva se destaca, quando se trata de resistência ao glifosato!

No entanto, uma questão importante é se realmente essa lista reflete a situação do campo. Ou, se é reflexo da presença de culturas de maior relevância econômica e espacial, ou ainda, da concentração de instituições de pesquisa.

O maior número de casos relatados no Sul e Sudeste do país, em culturas como milho e trigo, com destaque para a soja, nos leva a acreditar que esse viés existe.

Da mesma forma, é interessante inferir sobre a área cultivada com transgênicos no país e seu manejo comum. Uma vez que, as aplicações de glifosato podem variar de 3 a 5 vezes, nessas circunstâncias. Além disso, o herbicida é frequentemente utilizado de forma isolada, assim, é provável que os números sejam ainda maiores.

Também, com a evolução da resistência ao glifosato, outros mecanismos de ação passaram a ser utilizados para contornar o problema. Como resultado, verifica-se em anos recentes, um aumento substancial nos relatos de resistência à múltiplos herbicidas.

E, certamente, o problema é maior quando mais de uma resistência está presente na área. No entanto, a correta diagnose das causas das falhas no controle é essencial. Saiba mais em “Sinais da resistência a herbicidas: você sabe identificar?

Extensão do problema

Estima-se que aproximadamente 10,6 milhões de hectares (ha) estejam infestados com biótipos resistentes de buva. Ainda, 8,2 e mais de 4 milhões de ha com capim-amargoso e azevém, respectivamente. Os dados são do pesquisador da Embrapa, Fernando Adegas e seus colaboradores.

Como referência, a área cultivada com soja na safra 2017/18 foi de aproximadamente 35 milhões de ha (MAPA, 2018).

Culturas geneticamente modificadas e o glifosato

Assim como em outros países, a evolução da resistência ao glifosato está fortemente associada ao cultivo da soja também resistente ao herbicida.

Devido a rápida e intensa adoção, hoje, o glifosato figura como o pesticida mais utilizado no mundo. Dos 8,6 bilhões de quilos de glifosato usados em 2015, estima-se que 56% tenha sido pulverizado sobre culturas geneticamente modificadas (Benbrook, 2016). 

Uma pressão de seleção jamais vista!

Mudanças na composição florística

A terceira Lei de Newton se aplica aqui. Em outras palavras, também no manejo de plantas daninhas, “toda ação, gera uma reação“.

O Brasil é exemplo em sistemas conservacionistas de cultivos de grãos. No entanto, benefícios incalculáveis de um lado, ressalvas de outro. A dependência, especialmente de glifosato para o manejo da cobertura do solo, põe ainda mais peso na pressão de seleção. Perpetuam-se espécies tolerantes, de difícil controle e que germinam na superfície da palha.

Além disso, anos de manejo exclusivamente baseado em um herbicida com alta eficiência de controle e sem residual causaram mudanças na composição e dominância das comunidades daninhas. Como resultado, espécies com elevada produção de sementes, mais de um fluxo e com uma janela longa de germinação foram favorecidas.

Além disso, a pressão de seleção tem levado à evolução e dispersão da resistência.

Entenda a resistência ao glifosato

A resistência ao glifosato pode ser conferida por alterações no sítio de ligação do herbicida, na enzima 5-enolpiruvilchiquimato-3-fosfato sintase (EPSPS) ou por mecanismos adversos a este. 

Alterações no sítio de ligação

Mutações podem ocorrer em um ou mais pares de bases, no gene da enzima, alterando a conformação, e consequentemente, a ligação do herbicida. Vamos simplificar?

Imagine um quebra-cabeça, onde a sequência correta das peças de uma fileira, permite o encaixe das peças da fileira seguinte e a formação perfeita da imagem. Nessa situação, não há resistência.

Agora, imagine que durante a montagem do quebra-cabeça, a peça de número 106 foi acidentalmente substituída por outra. Na fileira seguinte, ainda há encaixe, no entanto, a imagem já não se forma corretamente.

Nesse caso, a resistência ao glifosato é considerada de baixo nível e, entorno de 2 a 6 vezes a dose que controla suscetíveis da mesma espécie.

Mas, você não percebeu a alteração na imagem e continuou montando o quebra-cabeça. Além da peça 106, a 102 também foi substituída por outra. Agora, o encaixe das peças da fileira seguinte se torna impossível.

Aqui, a mutação dupla confere alto nível de resistência ao herbicida, chegando a um fator de 180 vezes. Consequentemente, aumentar a dose do herbicida não terá nenhum efeito. Casos assim foram relatados em biótipos de capim pé-de-galinha.

Para fins de comparação, o fator de resistência da soja transgênica é de, aproximadamente, 50 vezes.

Um outro mecanismo relacionado ao local onde o herbicida se liga é a amplificação. É como se existissem muitas e muitas cópias do quebra-cabeça. Ou seja, mesmo que o herbicida se ligue perfeitamente em algumas, sobram outras para manter normais as funções fisiológicas da planta daninha.

Resistência não relacionada ao sítio de ligação

Nesse caso, o local onde o glifosato se liga se mantém inalterado, porém, as concentrações que chegam até ele, são insuficientes para causar a morte da planta daninha. O fator de resistência pode variar de 3 a 12 vezes.

Um possível processo seria a metabolização do glifosato para compostos menos tóxicos como o ácido aminometilfosfônico (AMPA) e outros subprodutos.

Porém, outro mecanismo frequentemente apontado é a reduzida absorção e translocação. Mudanças químicas e morfológicas na cutícula, assim como na orientação da folha podem ocorrer, reduzindo a absorção.

Uma vez absorvido pelas folhas, o glifosato se move para os pontos de crescimento da planta. Em algumas espécies, como na buva, ao invés de chegar até a EPSPS, o herbicida é transportado para o vacúolo, uma espécie de lixeira da célula, ou, o local onde compostos tóxicos podem ser isolados. Temperaturas baixas reduzem esse processo.

Outro mecanismo de resistência tem sido chamado de efeito “Fênix” – o renascimento a partir das cinzas. As folhas que absorveram o herbicida secam dentro de poucas horas, impedindo a translocação para os meristemas. Após, a planta daninha rebrota rapidamente.

Mais sobre resistência de plantas daninhas a herbicidas em: Considere a herança da resistência a herbicidas nas decisões de manejo.

Ao basear o controle, exclusivamente, em glifosato

De modo geral, pode ocorrer a combinação de vários dos mecanismos citados em biótipos resistentes, dentro de uma mesma espécie. E, com a constante exposição ao herbicida, os baixos níveis de resistência conferidos por cada um deles, vão lentamente se acumulando, até que a ausência de controle seja percebida no campo. 

Quer dizer que

A frequência inicial na população, de indivíduos resistentes devido à alterações no sítio de ligação do glifosato, costuma ser baixa. Assim, práticas que previnem o movimento de sementes e propágulos são muito importantes para evitar a dispersão da resistência a esse mecanismo de ação.

Como a resistência não relacionada ao sítio de ligação é “construída” lentamente, doses de glifosato abaixo das recomendadas ou que, permitam a sobrevivência das plantas daninhas, favorecem a seleção da resistência.

Além disso, a sobrevivência de indivíduos possibilita cruzamentos que podem “enriquecer” o nível de resistência.

imagem de uma planta de buva com sintomas de resistencia ao herbicida glifosato - Entenda a resistência ao glifosato e esteja um passo à frente
Planta de buva que sobreviveu à aplicação do herbicida glifosato.

Ou seja, é importante reduzir a taxa de sobrevivência, viabilizando as condições que maximizam o controle. 


Conheça e aplique melhor é uma série de conteúdos do WeedOut onde são apresentadas as características técnicas dos herbicidas, que influenciam na eficiência de controle. Conheça as do glifosato


Da mesma forma, a produção de sementes e alimentação do banco de sementes do solo deve ser evitada.

A resistência ao glifosato vai ocorrer na sua lavoura

A medida que o controle vai se tornando deficiente, a reação predominante é reaplicar glifosato, aumentar a dose, misturá-lo com outros herbicidas, ou ainda, aplicações sequenciais com herbicidas de contato (nocaute).

No entanto, basear o controle de plantas daninhas, exclusivamente, em estratégias químicas está se traduzindo em complexos mecanismos de resistência a múltiplos herbicidas. E uma vez desenvolvida, a rotação de diferentes mecanismos de ação pode não ser mais eficiente.   

Nesse contexto, as opções de herbicidas são drasticamente reduzidas e, inclusive, podem afetar o desempenho das novas tecnologias que serão disponibilizadas em breve.

No entanto, embora a resistência ao glifosato seja recorrente, o herbicida ainda é muito eficiente no controle de uma série de plantas daninhas. Assim, não há perspectivas de grande redução no seu uso. Dessa forma, é de extrema importância adotar práticas de manejo que mitiguem a resistência, uma vez que, as perspectivas são de que os casos continuem aumentando rapidamente.

Herbicidas são ferramentas preciosas!

Todas vez que um herbicida é aplicado fora das condições ideais para a expressão do seu máximo potencial, um recurso é desperdiçado. Assim, a palavra de ordem é conhecimento para aplicar proativamente uma maior diversidade de práticas de manejo, afim de, retardar a evolução e dispersão da resistência. Nós falamos mais sobre esse assunto aqui!

Literatura consultada

Adegas, F. et al. Status of herbicide weed resistance in Brazil. Proceedings of the Global Herbicide Resistance Challenge, Denver, Colorado, 2017.

Benbrook,  C. M. Trends in glyphosate herbicide use in the United States and globally. Environmental Science Europe, v. 28, n. 3, p. 1-15 , 2016.

Brasil. Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Projeções do Agronegócio : Brasil 2017/18 a 2027/28 projeções de longo prazo / Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Secretaria de Política Agrícola. – Brasília : MAPA/ACE, 2018. 112 p.

Duke, S. O. The history and current status of glyphosate. Pest Management Science, v. 74, n. 5, p. 1027-1034, 2017.

Green, J. M. (2016). The rise and future of glyphosate and glyphosate-resistant crops. Pest Management Science, v. 74, n. 5, p. 1035-1039, 2017

Heap, I., Duke, S. O. Overview of glyphosate-resistant weeds worldwide. Pest Management Science, v. 74, n. 5, p. 1040-1049, 2017.

Heap, I.  The International Survey of Herbicide Resistant Weeds. Disponível em www.weedscience.org. Acesso em 21 de maio de 2019. 

Peterson, M.A. et al. The challenge of herbicide resistance around the world: a current summary. Pest Management Science, v. 74, n. 10, p. 2246-2259, 2018.

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