misturas de herbicidas

Misturas de herbicidas em tanque: entenda as possíveis interações

Aumento do espectro de controle, atividade residual, atraso na evolução da resistência e economia de recursos. Essas são apenas algumas das vantagens das misturas de herbicidas em tanque. Por outro lado, incompatibilidades podem comprometer completamente a aplicação.

Saiba mais sobre as possíveis interações e acerte na mistura!

Embora comumente utilizada no campo, no Brasil, a regulamentação que cria a possibilidade veio apenas em 2018, pela Instrução Normativa Nº 40. Ela prevê a indicação no receituário agronômico, das informações relativas à mistura, assim como, sobre possíveis incompatibilidades e advertências específicas para a aplicação. A IN alerta ainda para a necessidade da correta interpretação das recomendações, aplicação das boas práticas agrícolas e do embasamento científico para a mistura.

A mistura ideal

Seria aquela onde a combinação de herbicidas promove aumento da atividade sobre as plantas daninhas e reduzida toxicidade para as culturas. Mas infelizmente, nem sempre é o que acontece.

O comportamento de cada herbicida na mistura é frequentemente afetado pelos outros produtos presentes, assim como adjuvantes e pela qualidade da água. Além disso, a atividade da mistura depende da espécie alvo, estágio de crescimento e das condições ambientais. Assim, podem ocorrer três efeitos.

Interações nas misturas de herbicidas

  • Efeito aditivo: quando aplicado separadamente, cada herbicida tem um efeito, certo?! Quando em mistura, o controle obtido será resultado da adição desses efeitos. Ou seja, não há nenhuma interferência na atividade dos herbicidas.
  • Sinergismo: nesse caso, a atividade da mistura é superior a soma dos efeitos dos herbicidas quando isolados.
  • Antagonismo: mas, como nem tudo são flores, muito frequentemente, a atividade da mistura é menor do que a soma do controle obtido quando os herbicidas são aplicados isoladamente. Ou seja, um ingrediente ativo compromete a atividade de outro ingrediente ativo.

Positivas ou negativas?

A resposta é o clássico “depende”! Nesse caso, depende principalmente do alvo.

Embora misturas sinérgicas sejam desejadas, a aumentada atividade pode se estender à cultura, causando perdas como resultado das injúrias causadas.

Da mesma forma, interações antagonísticas normalmente resultam em comprometimento do controle por algum dos herbicidas na mistura. Por outro lado, quando o antagonismo é conhecido, pode ser utilizado para aumentar a seletividade para a cultura. Um exemplo é a mistura de fenoxaprope-etílico com MCPA, que reduz a fitotoxicidade do graminicida para as culturas do trigo e cevada (Deschamps et al., 1990).

Além disso, as interações entre herbicidas e outros compostos podem ser utilizadas para modular o espectro de atividade. Esse é o caso dos antídotos ou safeners que podem ser adicionados nas formulações ou ainda, no tratamento de sementes.

As interações entre os herbicidas na mistura podem ocorrer antes, durante ou após a aplicação da calda de pulverização.

Mecanismos de interação entre herbicidas

  • Bioquímicos: um herbicida interfere na absorção, translocação ou metabolismo do outro, reduzindo a concentração que chega até o sítio de ação.
  • Competitivos: nesse caso, um herbicida da mistura afeta a ligação do outro ao sítio de ação.
  • Fisiológicos: os herbicidas combinados na mistura possuem efeitos fisiológicos complementares ou opostos. Um exemplo é o sinergismo entre inibidores da síntese de carotenoides e do fotossistema II. A ausência dos carotenoides para dissipar o excesso de energia gerado pela interrupção do fluxo de elétrons potencializa o controle.
  • Químicos: reações químicas na mistura de herbicidas levam à formação de complexos biologicamente inativos. Nesse mecanismo, normalmente a reação ocorre na calda de pulverização ou na superfície pulverizada. Precipitações, formações de géis e entupimentos também são comuns nesses casos (Figura 1).

Ainda, é possível que mais de um mecanismo esteja envolvido na interação.

IMG 4564 - Misturas de herbicidas em tanque: entenda as possíveis interações
Figura 1 – A incompatibilidade química na mistura de herbicidas em tanque pode levar a formação de precipitados que obstruem o sistema de filtros do pulverizador.

Como o efeito é verificado?

As informações disponíveis na literatura são fruto de experimentos conduzidos em casa de vegetação ou em campo. São usados ensaios de única dose, comparando o efeito exercido pela dose de rótulo do herbicida A com a dose de rótulo do herbicida B, isolados e em mistura. Ou ainda, o efeito isolado e em mistura, através de curvas de dose-resposta, com múltiplas doses. As possíveis interações são verificadas através de modelos matemáticos, como o multiplicativo e o dose-aditivo.

Fatores que afetam a eficiência das misturas de herbicidas

Conhecer as características físico-químicas dos herbicidas a serem combinados é fundamental. Grupo químico, mecanismo de ação, rotas de absorção, translocação e metabolismo são propriedades que influenciam decisivamente na compatibilidade.

Sabendo da importância, estamos reunindo essas informações na série “Conheça e aplique melhor”. Para acessar esse conteúdo, basta clicar aqui.

De modo geral, herbicidas do mesmo grupo químico, mecanismo de ação e rotas similares de metabolismo tendem à misturas sinérgicas. Por outro lado, quando essas características são muito diferentes, a mistura tende ao antagonismo.

Herbicidas absorvidos e translocados pela mesma rota tendem a competir, reduzindo a eficiência da mistura. O ideal seria misturar um herbicida absorvido via foliar com outro absorvido pelas raízes. Ou ainda, um altamente móvel com outro com baixa mobilidade. Porém, atenção para a velocidade de ação. Uma vez que um herbicida lesou os tecidos, pode reduzir drasticamente o movimento do outro presente na mistura.

Uma prática comum é a mistura de herbicidas graminicidas com latifolicidas, com o objetivo de ampliar o espectro de controle. No entanto, frequentemente resulta em antagonismo, com reduzido controle das gramíneas. A interação negativa costuma ser atribuída à redução na absorção e translocação do graminicida. A adição à calda de pulverização de adjuvantes e aditivos que favorecem a absorção contribui para amenizar o antagonismo.

Além disso, os pontos de crescimento das gramíneas são protegidos pela bainha da folha e os nós consistem em obstáculos que dificultam a translocação. Em alguns casos, essas características contribuem para a redução do controle dessas plantas pela mistura de graminicidas + latifolicidas.

Alguns relatos de antagonismo nas misturas de herbicidas

Bentazon + setoxidim

Ocorre antagonismo químico. A eficácia do setoxidim é reduzida na presença de bentazon devido à troca dos íons Na+ com o H+ do radical hidroxila do graminicida, formando sal sódico de setoxidim. A reação compromete a absorção e translocação do herbicida, já normalmente reduzidas.

Alguns relatos estendem o antagonismo à todas as ciclohexanodionas, o grupo químico dos “dins“, dos inibidores da ACCase. Cletodim é outro exemplo. Quando em mistura, uma prática é aumentar a dose do graminicida.

Arilofenoxipropionatos + mimetizadores de auxinas

Herbicidas pertencentes a este grupo químico, como fenoxaprope-P-etílico e haloxifope-P-metílico apresentam atividade antagonista quando misturados com auxinas sintéticas. Os graminicidas causam a despolarização da membrana, enquanto os auxínicos, repolarizam o potencial, pela estimulação da atividade da ATPase, restaurando a homeostase citoplasmática.

Além disso, os graminicidas inibidores de ACCase são comumente apontados por terem a atividade reduzida quando em misturas de tanque. São relatadas interações que resultam em antagonismo com sulfoniluréias, imidazolinonas, 2,4-Dcarfentrazone, metribuzin, dicambaacifluorfem-sódico e piritiobaque-sódico.

Paraquat + MCPA

Reações químicas entre o íon paraquat positivamente carregado com o MCPA, em sua forma iônica, com carga negativa, são apontadas como causa do antagonismo.

De modo geral, a ação de MCPA reduz a translocação via simplasto. O que é apresentado como causa para a redução da atividade também de outros herbicidas em mistura.

Glifosato + herbicida de contato

A mistura costuma ser aditiva em plantas daninhas anuais. No entanto, em espécies perenes, com sistemas de reserva bem estruturados e onde é necessária uma boa translocação do herbicida sistêmico, pode ocorrer antagonismo devido ao rápido comprometimento dos tecidos, pelo paraquat.

Bispiribaque-sódico + Cialofope-butílico

Forte antagonismo é relatado, com severa redução no controle do cialofope-butílico.

Sulfoniluréias + MCPA

A mistura reduz a atividade em plantas daninhas “folhas largas”. No entanto, a interação é restrita à mistura dos herbicidas em tanque, uma vez que o efeito negativo não é verificado em aplicações sequenciais dos mesmos.

O desejado sinergismo

Um caso típico de sinergismo – e o mais frequente – é a aumentada absorção e translocação quando herbicidas são misturados a adjuvantes. No entanto, como estamos tratando de misturas entre herbicidas, os relatos já se tornam mais escassos.

Inibidores do Fossistema II + Inibidores da biosíntese de carotenoides

Como já mencionado, os carotenoides exercem um papel fundamental na proteção do fotossistema, dissipando o excesso de energia, durante a fotossíntese. Na ausência dessa proteção, o efeito dos inibidores do FSII é aumentado.

Atrazina + Alacloro

Severa inibição da síntese de proteínas é associada a maior fitotoxidade dos herbicidas em mistura. Inclusive, há no mercado misturas formuladas com os dois ingredientes ativos.

Glifosato + Imidazolinonas

O sinergismo é atribuído à inibição paralela da síntese de aminoácidos por ambos os mecanismos de ação. O efeito é verificado tanto em gramíneas, quanto em “folhas largas”.

Para conhecer detalhadamente o mecanismo de ação do glifosato, clique aqui.

Vale ressaltar que a qualidade da água, pH e dureza, além do volume de calda são apontados por influenciar na estabilidade das misturas. Além disso, o comportamento das misturas de herbicidas em tanque pode diferir em razão da grande diversidade de formulações disponíveis no mercado. Para saber mais sobre formulações de herbicidas, clique aqui.

Além disso, não é intenção desse artigo substituir qualquer recomendação. Por isso, consulte sempre um(a) engenheiro(a) agrônomo(a) e siga as instruções do receituário!

Referências

Börger, P., Wakabayashi, K., Hirai, K. (Eds.). Herbicide classes in development: mode of action, targets, genetic engineering, chemistry. Springer-Verlag Berlin Heidelberg. 2002. 373 p.

Damalas, C. A. Herbicide tank mixtures: common interactions. International Journal of Agriculture & Biology, v. 6, n. 1, p. 209-212, 2004.

Deschamps, R. J. A., Hsiao, A. I., Quick, W. A. Antagonistic effect of MCPA on fenoxaprop activity. Weed Science, v. 38, p. 62–66, 1990.

Duke, E. O. (Ed.). Herbicide-Resistant Crops. Agricultural, environmental, economic, regulatory and technical aspects. CRC Press, Taylor & Francis Group, Boca Raton, FL. 2018. 437 p.

Duke, E. O. (Ed.). Weed Physiology. Vol II: Herbicide Physiology. CRC Press, Taylor & Francis Group, Boca Raton, FL. 2018. 268 p.

Foy, C. L. (Ed.). Adjuvants for agrichemicals. CRC Press, Taylor & Francis Group, Boca Raton, FL. 1992. 764 p.

Gressel, J. Synergizing herbicides. Reviews of Weed Science, v. 5. p. 49-82, 1990.

Hatcher, P. E., Froud-Williams, R. J. (Eds). Weed research: expanding horizons. Jonh Wiley & Sons Ltd, West Sussex, UK. 2017. 466 p.

Kirkwood, R. C. (Ed.). Target sites for herbicide action. Springer Science+Business Media, New York. 1991. 351 p.

Monaco, T. J., Weller, S. C., Ashton, F. M. Weed Science: Principles and Practices. 4th ed. John Wiley & Sons, Inc., New York. 2002. 685 p.

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