resistência do azevém ao glifosato

Como a descoberta do mecanismo de resistência do azevém ao glifosato pode afetar o manejo?

A resistência do azevém ao glifosato exige entendimento, quanto às estratégias para reduzir os efeitos negativos aos cultivos.

Pelo Eng. Agr. Dr. Joanei Cechin, professor da Universidade Estadual de Ponta Grossa

O azevém (Lolium multiflorum Lam.) historicamente tem grande importância dentro dos sistemas de produção, sendo amplamente utilizado como alimento para o gado e como planta de cobertura para sistemas de semeadura direta e áreas de pomares (Figura 1). A ressemeadura natural do azevém, antes da semeadura da soja, permite reduzir custos bem como garantir novos fluxos para próxima estação de cultivo. No entanto, é considerado a principal planta daninha dos cereais de inverno. Especialmente em trigo e cevada onde as perdas de produtividade podem ser superiores a 50%, dependendo da densidade populacional (Agostinetto et al., 2008).  

Azevém - Como a descoberta do mecanismo de resistência do azevém ao glifosato pode afetar o manejo?
Figura 1: Sistemas de produção manejados com azevém para alimentação animal e/ou cobertura de solo e presença de azevém na cultura do trigo. (Foto: Joanei Cechin)

Entenda o problema

Para as operações de pré-semeadura do trigo e da soja, a dessecação do azevém com o herbicida glifosato, em doses entre 1080 e 1440 g e.a. ha-1, sempre foi considerada uma prática de controle eficiente, possibilitando a semeadura em área limpa.

Em plantas suscetíveis, o herbicida glifosato inibe a enzima 5-enolpirulvil-chiquimato 3-fosfato sintase (EPSPs) envolvida na síntese de aminoácidos aromáticos. Afeta diferentes processos fisiológicos, tais como a fotossíntese e o metabolismo do carbono, e por fim, levando à morte das plantas (Gomes et al., 2014). No entanto, o uso repetido do glifosato, frequentemente aplicado mais de quatro vezes dentro de uma mesma área e em estádios inadequados da planta daninha, favoreceu a evolução do azevém resistente ao herbicida. O primeiro caso foi confirmado no ano de 2003, na região de Vacaria-RS (Roman et al., 2004).

Analisando uma população coletada em São Valentim-RS, através de curva dose-resposta, os resultados indicaram que para controle de 80% da população resistente é necessário 6700 g e.a. ha-1, representando uma dose superior a 18 L ha-1 (Cechin et al., 2020). Além disso, recente levantamento realizado no Brasil estima que o azevém resistente ao glifosato esteja presente em mais de 7 milhões de hectares (Lucio et al., 2019), evidenciando a necessidade de práticas de manejo para reduzir a evolução da resistência e minimizar seus efeitos negativos a produção.

Aliás, você sabe identificar os sinais da resistência de plantas daninhas a herbicidas?

Azevém resistente e suscetível - Como a descoberta do mecanismo de resistência do azevém ao glifosato pode afetar o manejo?
Figura 2: Azevém resistente e suscetível ao glifosato submetido a dose de 2880 g e.a. ha-1, aos 30 dias após aplicação (Foto: Joanei Cechin)

Mecanismos envolvidos na resistência do azevém ao glifosato 

Embora a descoberta não seja recente, a identificação e caracterização dos processos envolvidos na resistência e sobrevivência desta planta daninha ainda era desconhecida, visto sua importância para estratégias de manejo.

Considerando os casos já conhecidos, especialmente dos Estados Unidos, as principais evidências para a resistência do azevém envolvem o aumento significativo de cópias do gene EPSPs (Salas et al., 2015), possibilitando novos sítios ativos para ligação, afetando diretamente o controle (Fernández-Moreno et al., 2017).

No Brasil, os mecanismos de resistência do azevém resistente ao glifosato e seus efeitos no manejo foram recentemente estudados. As pesquisas desenvolvidas em nível molecular, através do sequenciamento total do genoma do azevém resistente ao glifosato, o que possibilitam a compreensão dos processos alterados pelo herbicida em populações resistentes e suscetível.

Ilustração - Como a descoberta do mecanismo de resistência do azevém ao glifosato pode afetar o manejo?
Figura 3: Etapas entre a aplicação do herbicida glifosato e os possíveis mecanismos de resistência envolvidos. (Fonte: Joanei Cechin)

Os resultados deste estudo recentemente publicado na revista Plants por Cechin et al. (2020), demonstraram que não houve mutação ou aumento de cópias do gene EPSPs, confirmando que não há alterações no local alvo de ação. Por outro lado, os níveis de expressão gênica diferencial evidenciaram que 146 genes foram regulados positivamente ou negativamente em resposta ao glifosato no biótipo resistente.

Menos glifosato no alvo

As principais alterações envolvem transportadores de membrana que dificultam a entrada do glifosato para dentro da célula, aumento na expressão de genes relacionados ao metabolismo através da atividade diferencial de glicosiltransferases e ABC transportadores envolvidos no sequestro extracelular. Os efeitos do transportadores de membrana na redução da quantidade do herbicida que chega ao local alvo foi confirmado pelo bioensaio do ácido chiquímico ou chiquimato, um intermediário da biossíntese dos aminoácidos aromáticos fenilalanina, tirosina e triptofano e, precursores de metabólitos secundários importantes para crescimento e desenvolvimento de plantas, com acúmulo três menor no biótipo resistente.

Para conhecer detalhadamente os mecanismos de resistência ao glifosato, clique aqui!

Quais as implicações para o manejo dos biotipos resistentes?

Embora não envolva o local alvo de ação herbicida, geralmente caracterizado pelo metabolismo diferencial de herbicidas, a resistência do azevém ao glifosato, devido principalmente a transportadores de membrana, não parece afetar significativamente a eficácia de outros herbicidas utilizados para controle de azevém.

Dessecação

Assim, o manejo químico do azevém na dessecação em pré-semeadura pode incluir o uso do glufosinato de amônio, paraquate, paraquate+diuron. Também, herbicidas inibidores da enzima Acetil CoA carboxilase (ACCase) como o cletodim, setoxidim, haloxifope-p-metílico, entre outros, que podem ser aplicados isoladamente ou associados ao glifosato.

Pós-semeadura

O controle do azevém em pré e pós-emergência da cultura durante o inverno depende da seletividade herbicida, podendo ser realizado com piroxasulfone em trigo e centeio nas aplicações em pré-emergência. Em pós-emergência do trigo e cevada, o herbicida iodosulfuron-metílico é considerada uma opção para controle de azevém resistente ao glifosato.

Por outro lado, piroxsulam, clodinafop-propargil e pinoxaden são opções para uso em trigo. Além disso, o herbicida imazamoxi também pode ser considerada uma opção para controle do azevém resistente ao glifosato em culturas com a tecnologia Clearfield® como trigo e canola.

Aplique manejo integrado!

Outras estratégias de manejo incluem o uso de métodos alternativos de controle como o uso de nabo para cobertura de solo no período pós-colheita da soja. Já a semeadura dos cereais de inverno, visando a supressão do azevém e, principalmente, práticas que sejam efetivas na redução da realimentação dos bancos de sementes do solo, visto que a longevidade é curta, podem ser empregadas.

Assim, reduzir a interferência do azevém deve ser o desafio para técnicos e agricultores a fim de evitar prejuízos à produtividade. Embora a resistência do azevém ao glifosato represente um problema significativo em áreas agrícolas e cause preocupação, as opções de manejo evidenciam que o cenário de resistência do azevém ao glifosato depende do nosso entendimento, quanto a estratégias a curto e longo prazo para reduzir seus efeitos negativos aos cultivos.

Referências

Agostinetto, D. et al. Período crítico de competição de plantas daninhas com a cultura do trigo. Planta Daninha, v.26, n.2, p.271-278, 2008.

Cechin, J. et al. Transcriptome analysis identifies candidate target genes involved in glyphosate-resistance mechanism in Lolium multiflorumPlants, v.9, n.6, p.685, 2020. https://doi.org/10.3390/plants9060685

Fernández-Moreno, P.T. et al. Differential resistance mechanisms to glyphosate result in fitness cost for Lolium perenne and L. multiflorum. Fronteirs in Plant Science, v.8, n.10, p.1-16, 2017.

Gomes, M.P. et al. Alteration of plant physiology by glyphosate and its by-product aminomethylphosphonic acid: an overview. Journal of experimental Botany, v.65, n.17, p.4691-4703, 2014.

ROMAN, E.S. et al. Resistência de azevém (Lolium multiflorum) ao herbicida glyphosate. Planta Daninha, v.22, n.2, p.301-306, 2004.

Salas, R.A. et al. EPSPS gene amplification in glyphosate-resistant Italian ryegrass (Lolium perenne ssp. multiflorum) from Arkansas (USA). Journal Agricultural and Food Chemistry, v.63, n.25, p.5885-5893, 2015.

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